Brasileiro que criou mosquito Aedes que não transmite dengue entra na lista dos cientistas que mudaram a ciência em 2025
Nature: brasileiro está na lista das 10 pessoas que moldaram a ciência em 2025 O pesquisador Luciano Moreira foi reconhecido como uma das dez pessoas que mold...
Nature: brasileiro está na lista das 10 pessoas que moldaram a ciência em 2025 O pesquisador Luciano Moreira foi reconhecido como uma das dez pessoas que moldaram a ciência em 2025 nesta segunda-feira (8). A lista é publicada anualmente pela revista Nature, considerada a mais influente do mundo na área científica. Se o nome dele ainda não era familiar para muitos brasileiros, a tendência é que isso mude rápido. No Brasil, ele lidera uma iniciativa que já vem reduzindo — e, no futuro, pretende eliminar — doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, como dengue, zika e chikungunya. Luciano Moreira, pesquisador selecionado na lista dos 10 mais influentes na pesquisa no mundo em 2025 pela revista Nature Divulgação No laboratório, ao longo de 17 anos de pesquisa, ele descobriu como criar uma versão do mosquito “turbinada” com uma bactéria chamada Wolbachia (a mesma que está naquela mosquinha da banana, por exemplo). Com ela, o vírus não consegue se proliferar no mosquito, fazendo com que ele seja quase inofensivo para nós, humanos. A inclusão de Moreira na lista da Nature coloca seu trabalho ao lado de descobertas que marcaram o ano: como o tratamento liderado pela pesquisadora Sarah Tabrizi, capaz de reescrever o DNA de um bebê e curá-lo de uma doença genética, e o desenvolvimento da maior câmera astronômica do mundo, coordenado por Tony Tyson, no Observatório do Chile. Eu fiquei muito emocionado, quase não acreditei. Acho muito importante, no Brasil, a gente conseguir fazer pesquisas de ponta. E o que mais me dá satisfação é ver que estamos conseguindo reduzir o sofrimento e as mortes no país. Estamos mostrando como a ciência consegue ajudar tantas pessoas. Hoje, os mosquitos criados por Luciano Moreira já estão em 16 cidades diferentes, e pesquisas recentes mostraram que alguns desses municípios conseguiram ter uma redução de até 89% dos casos de dengue. ➡️ Exterminar a dengue é um desafio para o Brasil, que há anos luta contra a arbovirose e vem enfrentando crises cada vez mais intensas — reflexo também das mudanças climáticas. Neste ano, por exemplo, mais de 1,7 mil pessoas morreram da doença no país. Como Luciano criou mosquitos “turbinados” Primeiro de tudo, Luciano conta que a paixão por entender os insetos veio de criança. No quintal onde cresceu, no interior, ele já pegava insetos para observá-los de perto e fazia misturas para entender as reações. Hoje, ele diz que isso não é recomendado de se fazer em casa. Essa curiosidade o levou ao mundo das espécies e aos laboratórios de pesquisa. Logo no começo da carreira como cientista, entendeu que queria fazer alguma coisa que ajudasse as pessoas, mas sem causar impacto ambiental. Foi justamente isso que o levou a essa descoberta. Ele tinha uma pergunta: como acabar com mosquitos da dengue sem exterminar a espécie? A resposta estava na bactéria Wolbachia. Como funciona: A estratégia desenvolvida pela equipe de Moreira usa a Wolbachia, encontrada naturalmente em diversas espécies de insetos — como a mosquinha da banana. No laboratório, eles introduzem a bactéria nos ovos do Aedes aegypti. A Wolbachia passa a viver dentro das células do mosquito. Isso muda tudo: para transmitir dengue ou zika, o vírus precisa se multiplicar dentro do inseto. Com a bactéria ali, o vírus não consegue se replicar adequadamente. Luciano Moreira está hoje à frente da maior fábrica de mosquitos do mundo Peter Illiciev O resultado: o mosquito continua vivendo normalmente, mas se torna quase incapaz de transmitir a doença. ➡️ Há outro ponto decisivo: toda fêmea infectada com Wolbachia passa a bactéria para os ovos. Assim, cada nova geração de mosquitos já nasce protegida, reduzindo a circulação do vírus. Isso também impacta o custo e o tempo de resultado da pesquisa, já que não é necessário repetir as solturas continuamente: o próprio mosquito “turbinado” perpetua sua nova característica. Hoje, Luciano é responsável pela maior fábrica de mosquitos do mundo, que fica em Curitiba. O complexo produz milhões de mosquitos “turbinados” que são distribuídos em cidades pelo país. Em parceria com o Ministério da Saúde, os Aedes aegypti turbinados estão em 16 cidades brasileiras. Neste ano, um artigo publicado na revista The Lancet, uma das mais conceituadas do meio científico, mostrou que, nas áreas onde os mosquitos de Luciano estavam, houve uma redução média de 63% dos casos de dengue. Em alguns locais, o resultado chegou a 89%. São 17 anos de pesquisa e muita persistência até chegarmos a esse resultado. Foi muito desafiador, mas é incrível ver o que estamos conseguindo fazer. Mosquitos são produzidos em larga escala em fábrica em Curitiba Brenda Nascimento Um reconhecimento para a ciência brasileira Moreira diz que o reconhecimento internacional reforça algo que ele já via no cotidiano dos laboratórios brasileiros: o poder das soluções criativas. Ele afirma que o país tem mentes brilhantes, mas ainda investe pouco em ciência para que pesquisas ganhem escala mais rapidamente. Ainda assim, a necessidade de ser criativo diante dos desafios tem sido um trunfo. “O diferencial do Brasil é a criatividade: a gente consegue fazer muito com pouco. Lembro que, no laboratório, a gente inventava alternativas com pouco insumo e ia mostrando que funcionava. Não há muito financiamento, mas ainda fazemos muito com pouco. Imagina o que seria possível se houvesse mais investimento?”, questiona Luciano. Quem são os demais nomes Mengran Du (China) – Geociência e exploração das profundezas do oceano Liderou uma expedição que levou um submersível a 9.000 metros de profundidade e revelou um ecossistema marinho nunca antes observado. Yifat Merbl (Israel) – Sistema imunológico e biologia de proteínas Descobriu uma nova função dos proteassomas, mostrando que essas estruturas podem produzir peptídeos antimicrobianos que ajudam o corpo a combater infecções. Sarah Tabrizi (Reino Unido) – Neurologia e doenças raras Desenvolveu uma terapia capaz de retardar a progressão da doença de Huntington, um distúrbio genético fatal sem cura conhecida. KJ Muldoon (Estados Unidos) – Primeiro caso de cura por edição genética Menino de 2 anos que recebeu uma terapia experimental de edição de genes que parece ter curado sua doença ultrarrara, tornando-se um marco para a medicina. Liang Wenfeng (China) – Inteligência artificial e computação Criou o DeepSeek, um modelo de linguagem potente construído com poucos recursos e lançado como “open weight”, permitindo que qualquer pessoa baixe e modifique. Achal Agrawal (Índia) – Integridade científica e políticas acadêmicas Investigou fraudes e problemas de integridade na pesquisa indiana, contribuindo para uma mudança histórica na política nacional de avaliação das universidades. Precious Matsoso (África do Sul) – Cooperação internacional em saúde Liderou as negociações que resultaram no primeiro tratado mundial de preparação para pandemias. Susan Monarez (Estados Unidos) – Defesa da ciência no serviço público Enfrentou pressões políticas no governo Trump ao recusar implementar medidas sem respaldo científico e se tornou símbolo da integridade científica institucional.